Em abril, uma das maiores expressões da nossa literatura, completaria 100 anos. Lygia Fagundes Telles, conhecida como a dama das letras brasileiras, começou a escrever ainda muito jovem, na adolescência. As profícuas décadas de escritas e reescritas renderam larga produção literária; são dezenas de contos, romances, memórias, crônicas e correspondências.
Desde seu primeiro livro, “Porão e Sobrado”, em 1939, até seu último, publicado em 2018, Lygia manteve sua obra vigorosa, conquistando leitores e críticos.
Capa de Porão e Sobrado, de Lygia Fagundes Telles
Nascida em São Paulo, em 1923, Lygia Fagundes Telles, tem, especialmente no que concerne a representação feminina na literatura, a mais importante das suas contribuições. Mulheres fortes, independentes e complexas, que rompem com os estereótipos tradicionais do papel feminino na sociedade, são personagens frequentes em suas obras.
Lygia Fagundes Telles em 1945
A Fundação Waldemar Alcântara conversou com a Professora Edma de Gois, Doutora em Literatura pela Universidade de Brasília e curadora e colaboradora dos jornais literários, Suplemento Pernambuco e Jornal Rascunho, sobre a autora.
Crédito: Ana T. Reis
Para Edma, o legado de Lygia reverbera nas fecundas autoras da atualidade. “Hoje, quando vejo uma série de autoras escrevendo, por exemplo, sobre a ditadura brasileira, escritoras de diferentes gerações e regiões do país, como Maria Valéria Rezende, Cláudia Lage, Sheyla Smanioto, Adriana Lisboa, Sônia Regina Bischain, Rosângela Vieira Rocha, Maria José Silveira, Beatriz Leal, Anita Deak e Elizabeth Cardoso, tenho convicção de que todas são de alguma forma herdeiras da coragem e da delicadeza de Lygia desde “As meninas,” de 1973.”
Os romances “Ciranda de Pedra” e “As Meninas”, esse último a indicação de leitura – ou releitura – da Professora Edma, são emblemáticos em sua carreira.
“A personagem Lia, inspirada em um jovem torturado e noticiado em panfleto em 1971, é a transformação do puro terror da ditadura em beleza, no seu livro “As Meninas”. Lygia arriscou na linguagem, no tema e na descrição da violência em um tempo pavoroso, de extremo risco. Ela já não precisava, mas ali mostrou ser grande.”
Sua habilidade narrativa, explorando, com envolvente linguagem poética, a psicologia dos personagens, remete o leitor a reflexões sobre a condição humana, nos deslocando para dentro da história de forma única e sublime.
Crédito: Alexandre Carvalho / A2img / Governo do Estado de São Paulo
O centenário de Lygia Fagundes Telles é uma oportunidade para relembrar a importância de sua obra e sua contribuição para a cultura brasileira.
“Falar de Lygia Fagundes Telles, no momento em que lembramos o seu centenário, nos permite pensar na sua obra não apenas como um marco importante na produção brasileira dos anos de 1950, quando ela começa a publicar, mas também na esteira aberta para outras escritoras brasileiras.”, completou Edma de Gois.
Sobre a estreita ligação entre sua obra e sua vida, em depoimento, Lygia disse: “Ao desembrulhar as minhas personagens posso estar desembrulhando a mim mesma, as ligações são profundas. O leitor, que considero meu cúmplice, talvez saiba descobrir melhor essas fronteiras entre autor e personagem assim como num jogo, eu não sei. Sei que escrevo no impulso da inspiração, palavra que saiu de moda mas é insubstituível, inspiração (TELLES, 2007, p. 97).”
Lygia foi membro da Academia Brasileira de Letras e recebeu diversos prêmios ao longo de sua carreira, como o Prêmio Camões e o Prêmio Jabuti. Além disso, ela dedicou grande parte de sua vida ao ensino da literatura, tendo sido professora da Universidade de São Paulo e da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Sobre sua qualidade como prosadora, escolhemos a voz de Antonio Candido:
A obra de Lygia Fagundes Telles (n. 1923) realiza a excelência dentro das maneiras estabelecidas de narrar. Mas ela sabe fecundá-las graças ao encanto com que compõe, à capacidade de apreender a realidade pelos aspectos mais inesperados, traduzindo-a de modo harmonioso. Tanto no conto quanto no romance, tem realizado um trabalho ainda em pleno desenvolvimento, sempre válido e caracterizado pela serena maestria (CANDIDO, 2010, p. 118).
No ano em que comemoramos seu centenário, a Fundação Waldemar Alcântara celebra a vida e obra dessa majestosa escritora, desejando que seus livros continuem sempre vivos em nossas mentes e corações.
Encontro com a autora: Lygia Fagundes Telles
Vídeo da Academia Brasileira de Letras
Um baile para Lygia, com Lucia Riff e Elizama Almeida e mediação Ana Maria Machado
Vídeo da Academia Brasileira de Letras